Bradyrhizobium e Azospirillum

Bradyrhizobium e Azospirillum: interação da natureza e da agricultura para a produção de alimentos

April 17, 2024
8mins
Karla Villaça
Brasil

Você sabia que depois da fotossíntese a Fixação Biológica do Nitrogênio (FBN) é o processo mais importantes para a sobrevivência das espécies? Para a agricultura brasileira o impacto é particularmente importante, considerando que o Brasil é o maior produtor e exportador de soja do mundo, com mais de 45 milhões de hectares plantados.

A literatura relata que para produzir 1 tonelada de soja são necessários aproximadamente 80 kg de nitrogênio (N), mas vale ressaltar que o experimento desenvolvido no Innovation Center e publicado pelo NPCT (Nutrição de Plantas Ciência e Tecnologia) aponta que a necessidade de N pela cultura de soja pode chegar a 180 kg de N por tonelada.

Considerando uma produtividade média das lavouras de soja do Brasil de 3.500 kg ha-1, caso fossem necessárias adubações com fertilizantes contendo N, por exemplo, seriam necessárias aproximadamente 55 milhões de toneladas de ureia para sustentar as plantações de soja brasileiras. A FBN permite uma economia de aproximadamente US$ 12 bilhões apenas em fertilizante nitrogenado. Além de trazer uma economia enorme para o agricultor, o impacto ambiental positivo da FBN também é muito grande, reduzindo as emissões de gases de efeito estufa e as perdas de nitrogênio por lixiviação e volatilização.

No ano de 2022, a soja brasileira foi destaque entre uma das 14 histórias de sucesso, que mostram a importância do microbiomas na economia, na agricultura e na saúde humana. A iniciativa é patrocinada pelo Horizon 2020 da União Europeia que envolve pesquisadores e empresas de 28 países.
A FBN é um dos pilares de sustentabilidade do sistema de produção de soja no Brasil e resulta em grandes benefícios para o produtor e para o meio ambiente, aumentando a competitividade do produto no mercado externo com menor impacto ambiental e, consequentemente maior sustentabilidade.

Apesar do nitrogênio atmosférico (N2) representar 78% da composição atmosférica, a forte ligação entre os dois átomos de N impede as plantas de absorver e assimilar esse N para utilização em seu metabolismo. Mas algumas leguminosas, como a soja, podem estabelecer uma relação simbiótica com bactérias capazes de fixar o nitrogênio. As bactérias mais famosas e utilizadas são as do gênero Bradyrhizobium.

Portanto, a FBN é uma simbiose entre bactérias do gênero Bradyrhizobium e as plantas de soja, formando os nódulos radiculares, nos quais as bactérias se abrigam e recebem proteção, nutrientes e fontes de energia da planta hospedeira. Em troca, capturam o nitrogênio atmosférico (N2).

O emprego de estirpes elite de Bradyrhizobium nos inoculantes, que foram selecionadas pela pesquisa ao longo de décadas, assegura o suprimento do N necessário para a cultura, mesmo em altos níveis de produtividade. Paralelamente, a indústria nacional de inoculantes diversificou e desenvolveu produtos, mais eficazes quanto ao estabelecimento de simbiose entre a cultura de soja e os Bradyrhizobium.

A inoculação é definida como a operação agrícola, realizada previamente à semeadura da cultura de soja, por meio da qual se possibilita, via inoculante, o contato físico entre a bactéria fixadora de N2 e a planta (semente). Uma boa inoculação só é obtida quando a superfície da semente é recoberta integramente pelas partículas do inoculante. Por questões operacionais, pode-se realizar a inoculação no sulco de semeadura, com a utilização de tanque exclusivo para o inoculante. Nesse caso, deve-se aumentar a dose de acordo com o especificado no rótulo do produto conforme registro no Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA).

O inoculantes deve conter duas das estirpes recomendadas para o Brasil e o número mínimo de 1,0 x 109 unidades formadoras de colônias (UFC) por g ou mL de inoculante em formulação sólida (turfoso) ou líquida, respectivamente, até o prazo final de validade do produto.
Para garantir a máxima eficiência da FBN é importante que todos os produtores adotem boas práticas recomendadas pela pesquisa, tais como:

1. Usar apenas inoculantes registrados para a cultura da soja no MAPA;
2. Utilizar o inoculante dentro do prazo de validade, estabelecido na embalagem;
3. Assegurar-se de que o produto tenha sido transportado e armazenado em local protegido do sol e com temperaturas inferiores a 30 °C;
4. Aplicar em dose adequada conforme a condição e a modalidade de uso.
Além disso, os seguintes fatores podem interferir na nodulação e na FBN, portanto é importante estar atento:
1. a garantia da concentração de células, da pureza e da eficiência das bactérias presentes no inoculante;
2. quando usar produtos químicos no tratamento de sementes, aplicar o inoculante na
última operação antes da semeadura e jamais misturar o inoculante diretamente com esses produtos;
3. temperatura e umidade, pois, durante o desenvolvimento da cultura temperatura e umidade do solo adequada promovem o metabolismo normal da planta e possibilitam maior sobrevivência das bactérias;
4. fotossíntese das plantas de soja uma vez que toda a funcionalidade do nódulo e a FBN dependem do adequando suprimento de carboidratos;
5. nutrição da planta de soja, com destaque para cobalto (Co), molibdênio (Mo) e níquel (Ni), elementos minerais essenciais para a atividade fisiológica dos nódulos.

 

Coinoculação, o que é e para que serve?

Além da inoculação anual com Bradyrhizobium, a Embrapa também recomenda, o uso conjunto de uma segunda bactéria para a inoculação da soja, em um processo denominado de coinoculação. Essa segunda bactéria, Azospirillum brasilense, já vem sendo recomendada pela Embrapa para as culturas de milho, trigo e arroz.

O gênero Azospirillum abrange um grupo de bactérias promotoras de crescimento de plantas (BPCP) podendo estimular o crescimento das plantas por diversas maneiras, sendo as mais relevantes o auxílio a capacidade de fixação biológica de nitrogênio, a produção de fito-hormônios e a solubilização de fosfato.
O principal processo microbiano do Azospirillum consiste na síntese de fito-hormônios que promovem o crescimento vegetal, principalmente do sistema radicular, o que favorece a nodulação e a FBN realizada pelo Bradyrhizobium, além de trazer outros benefícios, como o maior crescimento e desenvolvimento do sistema radicular, o que aumenta o volume de solo explorado.

Como o Azospirillum contribui para o crescimento das plantas?

Na literatura existem vários relatos que o Azospirillum produz fito-hormônios que estimulam o crescimento das raízes de diversas espécies de plantas, influenciando na absorção da água e minerais, na melhoria de parâmetros fotossintéticos, incluindo o teor de clorofila e condutância estomática, maior teor de prolina na parte aérea e raízes, melhoria no potencial hídrico, produção de biomassa, na tolerância a estresses como salinidade e seca, resultando em uma planta mais vigorosa e produtiva.

No Brasil, inoculantes com Azospirillum brasilense são comercializados anualmente para gramíneas e, também, para coinoculação da soja e do feijoeiro. Hoje, no mercado, para o Azospirillum só existem inoculantes líquidos. O inoculante líquido pode ser misturado às sementes ou sulco de semeadura, com a utilização de tanque exclusivo para o inoculante, seguindo a dose de acordo com o especificado no rótulo do produto conforme registro no Mapa. Assim como acontece para as bactérias do gênero Bradyrhizobium.

Para garantir a máxima eficiência na inoculação com Azospirillum brasilense é importante que todos os produtores adotem boas práticas recomendadas pela pesquisa, tais como:
1. Usar apenas inoculantes registrados para a cultura da soja no MAPA;
2. Utilizar o inoculante dentro do prazo de validade, estabelecido na embalagem;
3. Assegurar-se de que o produto tenha sido transportado e armazenado em local protegido do sol e com temperaturas inferiores a 30 °C;
4. Aplicar em dose adequada conforme a condição e a modalidade de uso.
É importante ainda estar atento:
1. à distribuição do inoculante seja uniforme;
2. não se recomenda a inoculação diretamente na caixa semeadora;
3. no caso de sementes tratadas com fungicida, inseticidas e/ou micronutrientes, o inoculante deve ser colocado por último e a semeadura deve ser realizada o mais breve possível;
4. se não for possível semear em 24 horas, repetir o processo de inoculação;
5. lembrar que o inoculante contém bactérias vivas, sensíveis ao calor e deficiência hídrica.
A utilização de micro-organismos no manejo agrícola bem como as boas práticas agrícolas de conservação do solo que favoreçam à vida biológica, são ferramentas importantes para alcançar os recordes de produtividade com sustentabilidade, utilizando a própria natureza a favor dos produção de alimentos.

Referências
BRASIL. Instrução Normativa n. 13, de 24 de março de 2011. Aprova as normas sobre especificações, garantias, registro, embalagem e rotulagem dos inoculantes destinados à agricultura, bem como as relações dos micro-organismos autorizados e recomendados para produção de inoculantes no Brasil. Diário Oficial da União, Brasília, 25 mar. 2011.
COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO. Acompanhamento de safra brasileira: grãos. Brasília, 2024. 25 p. (6º levantamento).
EMBRAPA. Coinoculação da soja com Bradyrhizobium e Azospirillum na safra 2019/2020 no Paraná. Londrina: Embrapa Soja, 2020. (Circular Técnica, 166).
EMBRAPA. Inoculação com Azospirillum brasilense: inovação em rendimento a baixo custo. Londrina: Embrapa Soja, 2011. (Documentos, 325).
CÂMARA, G. M. S. Fixação biológica de nitrogênio em soja. Informações Agronômicas, n. 147, p. 1-9, 2014.
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OLMO, R. et al. Microbiome research as an effective driver of success stories in agrifood systems – a selection of case studies. Frontiers in Microbiology, v. 13, p. 1-23, 2022.