Manejo do enxofre e do boro no algodoeiro.

Manejo do enxofre e do boro no algodoeiro.

October 1, 2021
8mins

Enxofre

O enxofre (S) compõe aminoácidos, proteínas, coenzimas e junto com o nitrogênio realiza o controle hormonal para o crescimento da planta, havendo uma relação ótima entre esses dois nutrientes de 12/1 (N/S) para o algodoeiro (Stipp e Casarin, 2010). O suprimento adequado de enxofre melhora a eficiência do nitrogênio na planta. A deficiência desse elemento surge primeiro nas folhas mais jovens (ponteiro) (Figura 1), devido à baixa mobilidade no floema, mas em casos de deficiência severa a deficiência pode migrar para as folhas mais velhas, causando o amarelecimento das folhas.

Figura 1. Deficiência de S em algodoeiro. (Foto: IPNI).

 

Na Austrália, estima-se que para produtividade de 1000 kg ha-1 de fibra, a planta absorve 10 kg ha-1 de S (42% exportado); já para produtividade de 2400 kg ha-1 de fibra, a absorção é de 62 kg ha-1 (18% exportado). No Brasil, Vieria et al. (2018), também reportaram quantidades absorvidas de S da ordem de 60 kg ha-1 em lavouras de alta produtividade na Bahia. A maior absorção ocorre durante o pleno florescimento. Os teores foliares de suficiência de enxofre variam entre 4 e 6 g kg-1 (Borin et al., 2014; Rochester, 2007). O suprimento adequado de S melhora a qualidade de fibra do algodoeiro (micronaire, maturidade e resistência da fibra) (Malavolta e Moraes, 2007), além da produtividade da fibra em até 37% em solos com baixo teor de S (Malavolta, 1996).
Por estar no solo predominantemente na forma de SO42- (ânion), não se liga as cargas negativas do solo, lixiviando facilmente, principalmente em solo arenoso devido à alta taxa de infiltração, o que torna necessária à coleta do solo nas camadas de 0-20 e 20-40 cm para recomendações da adubação sulfatada. Nos solos do cerrado brasileiro de baixa fertilidade natural, e baixo teor de MOS, a reposição de enxofre deve ser realizada de forma regular, via fertilizantes, visando os níveis adequados do elemento no solo (>10 mg dm-3) (0-40 cm). A dose ótima de enxofre varia entre 15 e 70 kg ha-1, e isso depende do teor do elemento no solo e do potencial produtivo da lavoura. Normalmente solos com teor de MOS < 2% (20 g dm-3) e/ou de textura arenosa, e lavouras com alto potencial produtivo (> 2000 kg ha-1 de fibra) as respostas a adubação com enxofre são maiores, devido à menor reserva no solo, maiores perdas por lixiviação e maior demanda das plantas.
As principais fontes de enxofre são: enxofre elementar, gesso agrícola, superfosfato simples e sulfato de amônio. A maior parte dos estudos não reporta diferença de resposta às fontes utilizadas, porém o custo por unidade de nutriente posto na fazenda deve ser considerado, uma vez que a maior parte das lavouras de algodão está distante dos centros produtores de fertilizantes fosfatados, cujo processo produtivo gera o gesso agrícola como subproduto. Para o superfosfato simples, a principal limitação é a menor concentração de P, o que aumenta o custo do frete e o operacional de distribuição, restando como opção o sulfato de amônio, que apresenta limitada disponibilidade, e maior custo por unidade de N aplicada, e o S elementar que para ser oxidado no solo (SO42-) necessita de boas condições de umidade e atividade microbiana. Uma opção, que vem sendo utilizada em lavouras de algodão, é o uso de ureia protegida com enxofre elementar. Essa estratégia pode atender a demanda de S da planta e melhorar a eficiência de uso do N. Geng et al. (2016) observaram aumento da produtividade (Figura 2) e da qualidade da fibra do algodoeiro quando se utilizou ureia protegida combinada com dose de enxofre de 60 kg ha-1 na China.
A fertilização de S via foliar tem baixa eficiência, devido a baixa mobilidade no elemento na planta, sendo recomendado apenas como adubação suplementar, em casos de deficiência severa, sempre priorizando a aplicação via solo.

 

Figura 2. Produtividade de fibra do algodoeiro, fontes de N (ureia convencional e ureia de liberação controlada) combinadas com doses de enxofre.

 

Boro

O boro (B) é o principal micronutriente requerido pelo algodoeiro, e este atua no metabolismo de carboidratos e transporte de açúcares, relações hídricas, desenvolvimento de tecidos, diferenciação, formação de paredes celulares e reprodução da planta. A deficiência de B ocorre principalmente nas folhas mais jovens (ponteiro) devido a baixa mobilidade do nutriente do floema (90% está ligado a parede celular e 10% disponível para remobilização). A deficiência B leva a baixa fertilidade das estruturas reprodutivas e aumenta o seu abortamento. Por ter transporte prioritariamente por fluxo de massa (dependente da transpiração das plantas), em períodos de dias nublados (comum em regiões produtoras de algodão), ou veranico, pode ocorrer sintomas de deficiência na planta, mesmo com teores adequados no solo (Rosolem e Bogiani, 2011), causando anéis marrons nos pecíolos (Figura 3). Microfotografias indicam que a deficiência de boro causa um desordenamento dos feixes vasculares, que ficam mais espalhados e apresentam maior oscilação no diâmetro dos vasos do xilema (Figura 4).

Figura 3. Anéis escurecidos no pecíolo indicando a deficiência de boro (Li et. al., 2017).

Figura 4. Microfotografia mostrando as mudanças da estrutura anatômica de pecíolos de algodão após a formação de anéis marrons sob deficiência de boro. (A) deficiência de boro e (B) controle. (a) câmbio vascular sob deficiência de boro e (b) câmbio vascular em plantas controle. (PL) floema; (VB) feixe vascular; (XL) Xilema; (PT) medula; (PV) feixe vascular primário; (SV) feixe vascular secundário (Li et al., 2017).

 

A principal reserva de boro no solo é a matéria orgânica do solo (MOS). No solo o B está presente principalmente na forma de ácido bórico (H3BO3), que pode ser facilmente lixiviado, principalmente em solos com baixo teor de argila e MOS, sendo o teor adequado no solo em torno de 0,6 mg dm-3. Para produtividade de 2400 kg ha-1 de fibra são necessários cerca de 0,5 kg de boro (Rochester, 2007), que é fornecido principalmente por meio da MOS e fertilizantes. A resposta ao algodoeiro ao boro está ligada principalmente ao potencial produtivo da lavoura, textura do solo, teor de MOS, teor do elemento no solo, forma de aplicação e fonte, mas altas doses de nitrogênio (como observado em lavouras no cerrado), também aumentam a demanda por boro, havendo relação direta entre os dois elementos na planta. Dessa forma em lavouras brasileiras a recomendação de boro está entre 0,5 e 2,5 kg ha-1, sendo que doses maiores associadas á textura do solo podem causar fitotoxidade às plantas, devido a estreita faixa de suficiência (16 a 80 mg kg-1) e toxidez (>100 mg kg-1) da cultura.
A aplicação de boro pode ser realizada na semeadura, cobertura (por volta dos 25 DAE), e em algumas situações via foliar. A aplicação de boro via foliar tem baixa eficiência, em decorrência da baixa mobilidade do nutriente no floema, podendo ser recomendado em situações de deficiência severa, com objetivo de amenizar os danos, ou em situações climáticas que inibam a absorção de boro via raiz (dias nublados ou restrição hídrica), mas sempre que possível a aplicação via solo deve ser priorizada, pois doses mais elevadas podem aumentar o risco de fitotoxidez (Figura 5).

Figura 5. Fitotoxidez causada pela aplicação foliar de 1 kg ha-1 de boro (Ácido bórico) em um solo arenoso.

As principais fontes de boro são: ácido bórico, bórax (alta solubilidade) e ulexita (baixa solubilidade). Apesar de poucos trabalhos na literatura, o algodoeiro pode ter respostas diferentes às fontes de boro, visto que fontes de baixa solubilidade pode ser mais eficientes para nutrição a planta, disponibilizando o nutriente até o final da formação dos frutos, dar maior flexibilidade da dose a ser aplicada, evitando fitotoxidade, e reduzindo as perdas por lixiviação. As demais opções são fertilizantes de semeadura com boro e fertilizantes com maior nível tecnológico (boro associado a enxofre ou potássio) em cobertura.
Por se tratar de um elemento de alta complexidade no sistema solo/planta, técnicas como plantio direto, plantas de cobertura, podem aumentar os estoques de boro no solo, via incremento da matéria orgânica, além de aumentar a ciclagem do elemento por meio das raízes das plantas de cobertura, reduzindo as perdas por lixiviação.

Referências

Borin, A.L.D.C.; Ferreira, G.B.; Carvalho, M.C.S. Adubação do Algodoeiro no Ambiente de Cerrado: Comunicado Técnico 375. Campina Grande: Embrapa, 2014. 8 p.
Li, M., Zhao, Z., Zhang, Z. et al. Effect of boron deficiency on anatomical structure and chemical composition of petioles and photosynthesis of leaves in cotton (Gossypium hirsutum L.). Sci Rep 7, 4420 (2017). https://doi.org/10.1038/s41598-017-04655-z
Malavolta, E.; Moraes, M.F. Fundamentos do nitrogênio e do enxofre na nutrição mineral de plantas cultivas. In: Yamada, T.; Abdalla, S.R.S., Vitti, G.C. (Eds.). Nitrogênio e enxofre na agricultura brasileira. Piracicaba: IPNI, 2007, p. 189-249.
Malavolta, E. Nutri-Fatos: Informações agronômicas sobre nutrientes para as culturas. Piracicaba: Potafos, 1996. p. 11-12. (Arquivos do agrônomo, n 10)
Rochester, I. J. 2007. Nutrient uptake and export from an Australian cotton field. Nutrient Cycling in Agroecosystems 77 (3):213–23. doi: 10.1007/s10705-006-9058-2.
Rosolem, C. A., Bogiani, J. C. Physiology of Boron Stress in Cotton. In: Oosterhuis, Derrick M.. (Org.). Stress Physiology in Cotton. 01ed.Cordova, Tennessee: The Cotton Foundation, 2011, v. 01, p. 113-124.
Stipp, S. R., Casarin, V. A importância do enxofre na agricultura brasileira. IPNI Brasil. Informações agronômicas, nº 129- março, 2010.
Vieira, J. L. V., K. T. Nardi, G. R. A. Silva, L. A. Moreira, E. Zavashi, T. A. Moura, and R. Otto. 2018. Nutrient uptake by high-yielding cotton crop in Brazil. Revista Brasileira Ciência do Solo 42 (1):2018. doi: 10.1590/ 18069657rbcs20170033.